domingo, 31 de janeiro de 2016

Miscelânea Goesa



 Miscelânea Goesa

«PAPÉIS DA PRISÃO», José Luandino Vieira


José Luandino Vieira, pseudónimo literário de José Vieira Mateus da Graça (Vila Nova de Ourém, 4 de Maio de 1935), português de nascimento, passou a juventude em Luanda, onde concluiu os estudos secundários.
Durante a Guerra Colonial, combateu nas fileiras do MPLA.
Detido pela PIDE, pela primeira vez em 1959, foi um dos acusados do Processo dos 50, acabando condenado a 14 anos de prisão, em 1961.
Em 21 de Maio de 1965, encontrando-se Luandino preso há quatro anos no Campo de Concentração do Tarrafal, a Sociedade Portuguesa de Escritores, então presidida por Jacinto do Prado Coelho, atribuiu-lhe o Grande Prémio de Novela pela sua obra «Luuanda».
Luandino Vieira cumpriu a pena de prisão no Campo do Tarrafal, em Cabo Verde, regressando a Portugal em 1972, com residência vigiada em Lisboa. Viria a trabalhar com o editor Sá Costa até à Revolução de Abril.
Em 1975 regressou a Angola. Foi co-fundador da União dos Escritores Angolanos, de que foi secretário-geral (1975-1980 e 1985-1992), e secretário-geral adjunto da Associação dos Escritores Afroasiáticos (1979-1984).
Na sequência das eleições de 1992, e do reinício da guerra civil angolana, regressou a Portugal.
 Radicou-se no Minho, em Vila Nova De Cerveira, onde vive em isolamento na quinta de um amigo, dedicando-se à agricultura.

Durante os anos de cárcere, José Luandino Vieira coligiu um acervo de textos constituído por 17 cadernos. O processo de escrita destes «Papéis» tem como termos cronológicos e fronteiras espaciais a entrada no Pavilhão Prisional da PIDE em Luanda (1961) e a sua saída do Tarrafal (1972).
 A materialidade destes cadernos é composta por aproximadamente 2000 fragéis folhas manuscritas onde o autor anotou a sua visão do cárcere como observatório da nação angolana, manifestou os seus projectos políticos e literários, evidenciou o projecto comunitário de Angola como o veículo da união e resistência colectiva, expressou angústias e sonhos pessoais.





14-5-63
   Muito movimento de tarde: J.R. quis-me dizer qualquer coisa mas não percebi. Vai escrever. S. Coelho afirmou-me que o pai do Z.M. tinha sido preso. Perguntei ao Augusto: hoje só entraram 4 estudantes negros, por uma «brincadeira» (como ele disse) e saem amanhã. Mas agora mesmo às 6 horas chegou um homem baixo, escuro, de óculos mto escuros, e grande mala acompanhado do advogado indiano Noronha (que foi juiz em N [ova] Lisboa). Será o pai do Z.M.? Mas veio sozinho, sem guarda. Terá sido impedido de embarcar?

15-5-63
   Ontem a mala e o homem baixo q. veio c/Custódio Noronha, eram visita para o Sebastião Coelho. Viu o Jac. Ele ir ter com eles, enquanto na visita.

1-9-63
   O chefe que está hoje de serviço (chefe Guerreiro) é natural de Goa, ajudante do Ten. Presa Fernandes da Sec. De Informações (i.e. pide) e segundo me disse o Zuzé na Índia era «bufo» apenas… aqui subiu logo a «chefe»…


4 e 5-XII[-1965]

   Um juiz indiano levanta-se e fica de pé no café, em Lisboa, enquanto outro entra e toma o seu café. É o porteiro do teatro D. Maria II.
   Mas é que o juiz é de casta inferior ( seg. A. Jacinto que lho contou o dr. Avelar).

Papéis da Prisão, Apontamentos, Diário, Correspondência (1962-1971), Vieira, José Luandino, CAMINHO, 2015

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JFSR 2016


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