Aquilino Ribeiro (1885-1963)
Nascido a 13 de Setembro de 1885 no
concelho de Sernancelhe, freguesia de Carregal de Tabosa, filho de Mariana do
Rosário Gomes e do padre Joaquim Francisco Ribeiro.
Verdadeiro "homem de acção",
um tipo social que o princípio do século XX muito exaltou, adere por completo
às movimentações republicanas, quer através de um posicionamento pela escrita,
quer através da participação em actividades que acabam por levá-lo à cadeia.
A este activismo político, há que
juntar a tenacidade com que, durante mais de duas décadas, promoveu uma
agregação formal e institucionalizada dos escritores até conseguir criar, unido
a alguns contemporâneos, a Sociedade Portuguesa de Escritores, de que foi
fundador e presidente, isto no ano de 1956.
É considerado por
alguns como um dos romancistas mais fecundos da primeira metade do século XX. O
tempo não lhe subtrai o prestígio de grande figura da escrita, reconhecido
dentro e fora de de Portugal. Atestam esse prestígio factos como a apresentação
da sua candidatura ao Nobel, proposta por Francisco Vieira de Almeida e
subscrita por José Cardoso Pires, David Mourão-Ferreira, Urbano Tavares
Rodrigues, José Gomes Ferreira, Maria Judite de Carvalho, Joel Serrão, Mário
Soares, Vitorino Nemésio, Abel Manta, Alves Redol, Luísa Dacosta, Vergílio
Ferreira, entre muitos outros.
"Alcança quem não cansa", diz o ex-libris de
Aquilino Ribeiro. Não poderia ter escolhido melhor este escritor, que se
designava a si próprio como um "obreiro das letras" e que trabalhou
incansavelmente quase até ao dia da sua morte, chegada a 27 de Maio de 1963.
"Mais não pude", pretendeu
Aquilino que fosse o seu epitáfio.
«CONSTANTINO DE BRAGANÇA VII VIZO-REI
DA ÍNDIA», por Aquilino Ribeiro
Portugália Editora, Lisboa, 1947
“ Palavras
Preliminares
(…)
Consultaram-me: tem relevo próprio este vizo-rei, ornamento da estirpe sereníssima? –
Julgo que sim. – Está disposto a escrever a sua história? – E a minha pena,
intransigente embora modesta, não sofre limitações? –Ora essa!
O livro, que eis aqui, nasceu dum curto
diálogo de semelhante teor. (…) Confesso que não saí da esteira de Diogo do
Couto, Gaspar Correia, P.e Francisco de Sousa, ecónomos da verdade que nos
resta. Que novidades oferece este livro? Presumo que algumas achegas para os
historiadores imparciais e determinados vislumbres duma realidade, quanto a mim
mal entrevistos até à data, embora surpreendidos por uma lupa convexa. (…) ”.
Casa da Soutosa,
Agosto de 1947 Aquilino Ribeiro
Capítulo III
A conversão dos
gentios. Política e água benta. O brâmane relapso
(…) A história do
domínio português no Oriente está tão estreitamente vinculada à história da
Igreja que, abstraindo desta, ficaria na obscuridade ou sem sentido grande
parte da gesta militar e política.
Constantino não podia atravessar imune
ao estigma da sua nação. Homem aberto a todas as auras do meio, não admira que
fosse profundamente católico. (…)
O novo Vizo-rei continuava, pois, em matéria
de proselitismo, a política que iniciara Francisco Barreto, individuada em Goa
pelos baptismos em monte.
A pia sacramental foram levados bandos e
até multidões inteiras de indígenas, com demonstrações de festa a que se
associara, depois de fomentá-los por toda a espécie de maneiras, o
Governador-geral. (…) Estava escrito que Constantino perfilhasse a obra do
Apostolado. Dois dias depois de desembarcar em terra, foi de visita ao Colégio
da São Paulo, onde os padres o receberam solenemente com um baptismo geral. E
acrescenta o Oriente Conquistado: «Edificado
e contente de ver este bautismo, se declarou por amparo e arrimo dos que de
novo se convertessem, e todos os dias mandava ao Padre Pai dos Cristãos cinco, oito,
dez catecúmenos, que ele mesmo convertia. Os fidalgos com este exemplo
convertiam os gentios seus fâmulos e corretores, os cidadãos, os moradores dos
seus palmares, e os levavam ao Vizo-rei como mimo, que ele estimava sobre todas
as riquezas do Oriente. Como se multiplicavam os missionários, cresceram também
os catecúmenos, e de onze de Setembro até onze de Dezembro do mesmo ano se
bautizaram na nossa Igreja por quatro vezes seiscentos e quarenta e sete almas.
Havia entre os gentios um brâmane mui versado nas Ordenações do Reino, grande
bacharel e demandista. Meteu-se o Vizo-rei um dia com ele na Câmara depois de o
ter bem despachado, vestiu-o com o seu roupão, lançou-lhe ao pescoço uma
fermosa moeda de oiro com o hábito de Santiago de que era comendador, e
pondo-lhe a gorra na cabeça lhe disse:
- Fazei-vos cristão e pedi o que
quiserdes, que tudo vos darei.
Mas
como a inclinação às demandas é indício de ânimo perverso, di-lo o Espírito
Santo nos Provérbios: Homo perversus
suscitat lites, não quis o presumido rábula render-se a tantos favores.»
JFSR 2016
JFSR 2016
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