quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

GOESES E O ESTADO NOVO (1) - MENEZES BRAGANÇA E O ACTO COLONIAL



Goeses e o Estado Novo (1)

Menezes Bragança e o Acto Colonial



Luís de Menezes Bragança [ n. Chandor(Salsete) 15-1-1878, f.10-7-1938]


 Jornalista, estreou-se no diário O Heraldo e no Nacionalista, tendo também colaborado no Heraldo. Em 1911, passou a ter um jornal seu, O Debate, para a defesa das ideias democráticas, onde se distinguiu em polémicas, versando questões religiosas, políticas e sociais. Com a fundação do Pracasha, continuou as suas campanhas, conquistando um lugar de destaque no jornalismo da Índia Portuguesa.Foi Presidente, por três anos, da Comissão Administrativa da Câmara das Ilhas, nomeada em 1910 pelo primeiro Governador da República, Couceiro da Costa. Presidiu ao 4.º Congresso Provincial, em 921, e representou a Índia no Congresso Colonial, realizado em Lisboa em 1924.
Foi membro do Instituto Vasco da Gama, instituição que actualmente se denomina Instituto Menezes Bragança.




«À Margem duma carta» *, Menezes Bragança
Editor – Balcrisna D. S. Sacardandó, Médico
Composto e impresso na Tipografia “Xri Xivaji” – Nova Goa, 1933

«(…) Descendente de gauncares de aldeia, amassado nas tradições glebárias do jono e coxi-vorado, da cotubana e xiristó, como podia eu (…) representar a tradição das caravelas, incarnar o espírito da conquista e sustentar, com firmeza e brio que “é da essência orgânica da Nação Portuguesa desempenhar a função histórica de possuir e colonizar domínios ultramarinos e de civilizar as populações indígenas que neles se compreendam”, - como dogmaticamente afirma e ensina o Acto Colonial?
(…) Se “a existência nacional se baseia, quási exclusivamente, sobre a obra de colonização”, as colónias tem de ser eternamente colónias, para Portugal continuar  existir. Nunca seremos senhores em nossa casa. Eternas crianças, não chegando nunca à maioridade. Perpétuos interditos. Em suma – “súbditos por essência orgânica”.
      Fora contra este princípio retrógrado e infamante, exumado dos cavoucos do passado pelos actuais dirigentes de Portugal, que a parte eleita do Conselho do Governo, interpretando o sentir da Índia, consignara na sua declaração de 4 de Julho esta reivindicação:
     A Índia Portuguesa não renuncia o direito, que tem os povos, de atingirem a plenitude da sua individualidade, até virem a constituir-se unidades capazes de dirigir os seus destinos, visto ser um direito originário, da sua essência orgânica”.
      É o princípio da autodeterminação, tão orgânico na vida dos povos como o princípio da Liberdade na vida dos indivíduos.
(...)Os seus arrazoados revelaram à Opinião Pública um facto ue ela ignorava: - a existência , em face do Ato Colonial, duma copiosa classe de indígenas, tão copiosa que abrange mais de metade da população desta Índia. E este simples facto nos presta um novo e formidável argumento para afirmar que o Acto Colonial afrontou os nossos direitos civis e políticos.
       A sua carta tornou também claro que os dois "Delegados do Governo Português na Índia" não se entendem acerca dos dois diplomas. Para um, são absolutamente "defensáveis". Para o outro, o Acto Colonial, pelo menos, melindrou a Índia e no Regulamento do serviço militar "há disposições" que ofendem os seus brios.
     Claro está que o sentir da Índia vai muito mais longe. O Acto Colonial é para ela uma verdadeira afronta. Não é uma simples questão de melindres ou susceptibilidades. Nem de denominações  - colónia ou província ultramarina – como não falta quem pense neste meio devastado pela retórica ou pelo fachadismo. »




* «Carta enviada ao snr. Menezes Bragança pelo Snr. Dr. António Alves»

O novo período político aberto pela Revolução de 28 de Maio de 1926, a Ditadura Nacional (1926-1933) ficou marcado por uma concepção autoritária e antiparlamentar do Estado.
Estado Novo é o nome do regime político autoritário, autocrata e corporativista de Estado que vigorou em Portugal durante 41 anos sem interrupção, desde a aprovação da Constituição de 1933 até ao seu derrube pela Revolução de 25 de Abril de 1974.
Como regime político, o Estado Novo foi também chamado Salazarismo, em referência a António de Oliveira Salazar, o seu fundador e líder. Salazar assumiu o cargo de Ministro das Finanças em 1928 e tornou-se, nessa função, uma figura preponderante no governo da Ditadura Militar. Ascendeu a Presidente do Conselho de Ministros em Julho de 1932, e esteve em funções até ao seu afastamento por doença em 1968.Porém, o Estado Novo abrange também o período em que o sucessor de Salazar, Marcello Caetano, chefiou o governo (1968-1974).
O Acto Colonial foi uma lei constitucional que definiu as formas de relacionamento entre a metrópole e as colónias portuguesas.
Foi aprovado em 1930, durante o período da Ditadura Nacional que antecedeu o Estado Novo, no governo de Domingos da Costa Oliveira, pelo Decreto n.º 18 570 de 8 de Julho de 1930, e republicado, sem o preâmbulo, quando da entrada em vigor da Constituição de 1933.
O Acto Colonial é o primeiro documento constitucional do Estado Novo,  numa altura em que Oliveira Salazar assumia as funções de ministro interino das Colónias.
Com este Acto, o conjunto dos territórios possuídos por Portugal passou a denominar-se Império Colonial Português.
O Acto Colonial restringiu e moderou a já limitada autonomia financeira e administrativa das colónias, reflectindo por isso o carácter centralizador e altamente colonialista do Estado Novo.
A publicação deste documento significou pois um passo em frente na estratégia de ascensão ao poder desenhada por Oliveira Salazar, que se assumiu como o defensor do império colonial.
O Acto Colonial marca também uma alteração no direito público colonial português, bem patente nas alterações operadas na terminologia. Nas constituições de 1822 a 1911, os territórios portugueses na África e na Ásia são chamados "províncias ultramarinas", fruto de uma política de assimilação. A partir deste momento, passam a ser designados "colónias".
No fundo, o Acto Colonial traduziu-se numa centralização do poder concentrada no ministro das Colónias, em detrimento da acção da Assembleia Nacional e dos governos coloniais.
Este documento é um instrumento para a criação de uma nova mentalidade colonial, que só veio a ser preterida depois da Segunda Guerra Mundial, com o fim do imperialismo, que precipitou o fim do Acto Colonial, revogado na revisão da Constituição de 1933 feita em 1951.

JFSR 2016

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