sexta-feira, 6 de maio de 2016

PAULO VI: O PAPA QUE ENFRENTOU SALAZAR



    VISITA DO PAPA PAULO VI À ÍNDIA

   Quando Giovani Montini, Cardeal Arcebispo de Milão, a 21 de Junho de 1963, foi eleito Papa, sucedendo a João XXIII, Franco Nogueira ao tempo Ministro dos Negócios Estrangeiros, num comentário à escolha de Paulo VI, observou que se tratava de uma vitória da “ala esquerda da Igreja”. De acordo com o Ministro, Salazar fez o seguinte desabafo: “Vamos ter tempos difíceis com a Igreja”.
PARIS MATCH n.º818/12 Décembre 1964
   Ainda nesse ano de 1963, foi conhecido o propósito do novo Pontífice participar no Congresso Eucarístico Mundial, em Bombaim. A possibilidade de o Papa ir à Índia – que dois anos antes anexara militarmente os territórios ultramarinos portugueses de Goa, Damião e Diu – foi vista por Salazar como “inconcebível”.
   Salazar ficou deveras irritado com a possibilidade de Paulo VI, em 1964, visitar a antiga Província Ultramarina Portuguesa, tudo fazendo no campo diplomático para impedir a realização da viagem anunciada. Na sua perspectiva, esta viagem seria uma legitimação que o Vaticano concedia à União Indiana, e com reflexos a nível internacional, e que Portugal não podia, de forma alguma, aceitar. A visita, no entender de Salazar, podia significar o apoio, pela Santa Sé, da anexação de Goa pela União Indiana.
   Quando Salazar soube da intenção de Paulo VI visitar Goa e orar no túmulo de São Francisco Xavier, sentiu uma profunda raiva interior, misturada com um forte sentimento de indignação. Ficou, como escreveu Franco Nogueira, “possesso de revolta”.
   Através do Cardeal Cerejeira, avisou que, se o Papa realizasse a viagem à Índia e, sobretudo, visitasse Goa, a Concordata – assinada entre Portugal e a Santa Sé, em 1940 – seria denunciada e a política religiosa de Portugal “radicalmente” alterada. Salazar ameaçou, ainda, cortar relações oficiais entre o nosso País e a Santa Sé.
   O Cardeal Cerejeira, extremamente preocupado e “aterrado” com a situação, encontrou-se por duas vezes com o Pontífice nesse ano de 1964. O último encontro seria a 13 de Outubro de 1964. E como parecia que estes encontros não surtiam o efeito desejado, inclusivamente no último o Papa não permitiu que se aflorasse o assunto, o Cardeal e a diplomacia nacional conseguiram contactar com diversas personalidades com vista a demover o Papa da sua visita a Goa.
Par un geste, le salut indien, il conquit le coeur de la foule
   Paulo VI fez a viagem, é certo. Mas ficou-se por Bombaim e não foi a Goa, como pretendia.
   A ida a Bombaim, realizada em Dezembro de 1964, constituiu um forte ponto de fricção entre o Estado Novo de Salazar e a Igreja Católica de Paulo VI.
   Salazar, criticou e condenou, de forma clara e inequívoca, a visita de Paulo VI. Mais: sentiu a atitude do Papa como um insulto a Portugal e aos milhões de católicos nacionais.
   Salazar classificou a visita de “agravo gratuito, no duplo sentido de que é inútil e de que é injusto, praticado pelo chefe do Catolicismo em relação a uma Nação católica”. Além de a ter considerado como uma “injúria feita a Portugal”.
   Paulo VI foi o primeiro papa a visitar os cinco continentes, e, até ao papa João Paulo II, o mais viajado, pelo que foi chamado o Papa Peregrino.

Fontes:



Sem comentários:

Enviar um comentário